"Sempre que desejo contar alguma coisa, não faço nada;
mas quando não desejo contar nada, faço poesia."
Manoel de Barros - Livro Sobre Nada

"O momento em que, hipoteticamente, você sente que está andando nu pela rua, expondo demais o coração, a alma e tudo o que existe lá dentro, mostrando demais de si mesmo. Esse é o momento em que, talvez, você esteja começando a acertar. "
Neil Gaiman - O Discurso "Faça Boa Arte"

"...eso es lo que siento yo en este instante fecundo..."
Violeta Parra - Volver a Los Diecisiete

quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

2015


Ouve, amor:
houve amor!
Ano de reencontros
e encontros.

De novo soprou o vento
trazendo o perfume da vida
tirando o conforto da prateleira
derrubando no chão frutos
já amadurecidos e reciclados
agora em novas árvores.

Apesar da lama, dos tiros,
da canalhice geral também
houve muita poesia e boa música.

Do sangue, do suor e das lágrimas
salvou-se cada gota derramada:
as lágrimas viraram risos,
sangue e suor viraram estrada.

O caminho está feito.
Ano que vem tem mais.




domingo, 27 de dezembro de 2015

The Living City III


Almoço de Natal em Santê e família grande à mesa.
A chuva chegara forte espantando o calor e a todos com o estrondo das gotas grossas e brancas como leite caindo sobre as telhas metálicas que cobriam o lugar.
Quem era criança chorou.
Quem era adulto se calou.
O barulho era tamanho que as pessoas não ouviam nem os próprios pensamentos.
Ele, com os olhos semicerrados mirava o nada e ouvia a voz da mulher que amava ecoando novamente em seu peito. Enquanto isso tentava amassar a tampa da cerveja com uma das mãos apenas.


sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

#recíproco


se te acalma o coração saber que existo
saiba que o meu se acalma em saber
que um dia nós dois existimos
e que foi bom.


quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

E o Amor faz 10 anos


"Papai! Esse ano terei um aniversário de dois números pela primeira vez! Estou tão feliz!!!!!"

     Pois é filha. Dois números. Eu também estou muito feliz.
     Dez anos desde que você chegou, naquela correria, numa véspera de Natal turbulenta de um ano atípico em que Deus me tirava coisas e pessoas com uma das mãos e devolvia belezas sem fim com a outra.
     A nossa primeira ceia de Natal com você no mundo foi no quarto da maternidade, eu e sua mãe somente, você lá no quarto andar, lutando. O cardápio: duas maçãs, duas bananas, dois pãezinhos. Dois de cada...
     É a ceia de Natal mais rica e farta de significados que já tive. Diante dela todas as outras se tornaram insossas.
     Você ainda ficou por lá mais 2 meses. Dois.
     Fomos vivendo outros Natais, outros aniversários, até que chegaram mudanças. Éramos três e agora, alternadamente, somos dois de cada vez, em duas cidades diferentes. Duas casas diferentes.
     Vejo você crescer de longe, nas suas conversas e opiniões, nas fotos que recebo, nas coisas que sua mãe me diz do seu dia a dia.
     Vejo você crescer de perto quando nos encontramos, através de suas dúvidas e anseios cada vez mais intrincados e principalmente através de suas mãozinhas cada vez maiores dentro das minhas a cada um de nossos passeios intermináveis pelo mundo.
     Duas maneiras de ver você crescendo...
     Filha, tenha certeza de uma coisa: você sempre terá nós dois, eu e sua mãe, na sua vida. Sempre. Você é o foco de nossas atenções e por você corremos tanto.
     Parabéns pelo seu aniversário! Muito obrigado por todo esse tempo conosco, nos ensinando a ser melhores a cada dia, superando nossos medos e angústias em nome de sua segurança e felicidade. Que Deus lhe abençoe sempre e que mantenha essa felicidade constante que irradia de dentro de você.
     Eu te amo!

Nós dois.


segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

Transformação


Cala a boca e solta a voz
que vem de dentro da alma.
Solta os bichos,
as amarras,
esquece o passado.

Solta rindo aquele "eu te amo"
quase soletrado,
sincero ou ornamental.
Espalha na mesa seus desejos
de beijo, de nuca,
do velcro absurdo das partes
e dos pensamentos escondidos.

Cala a boca e dê
as respostas rápidas
a quem as procura
mesmo sem perguntar.

Apenas responda rápido.

A vida não espera.


terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Ato e efeito


Aquilo tudo durava horas:
a conversa das bocas
a fala dos olhos
o sussurrar dos corações.

Conversavam sobre o mundo
e se entendiam.
Falavam sobre eles próprios
e quase se entendiam.
Sussurravam seu amor
e não se ouviam.

No final concluiram-se
mudos,
cegos,
surdos.

E mortos.


(Ataíde Miranda: O Amor Tem Fases em P&B
nanquim sobre canson A3 )

sábado, 5 de dezembro de 2015

The Living City II


Saiu às pressas de São José onde fora agradecer algumas coisas e pedir outras. Apesar do sol ainda alto, o vento aumentava e trazia o som de trovões que espoucavam ao longe.
Atravessou Afonso Pena, viu a chuva despencando e derretendo as nuvens sobre a Serra. Calculou que em menos de cinco minutos tudo ali estaria molhado.
Alcançou Espírito Santo ensurdecido pelo tráfego e pelo repicar dos sinos da Matriz que parecia chamar o mundo inteiro para a missa das sete. O vento forte entrou junto com ele pelo canyon de prédios e, ao dobrar a esquina e passar pelo Acaiaca fez o índio da fachada assoviar alto, anunciando a tempestade.
Correu.
Desaguou em Amazonas ainda seco da chuva mas molhado de suor.
Pensava cegamente no encontro que teria mais tarde.
Precisava dos beijos e da pele daquela mulher tanto quanto precisava dessas letras e dessas linhas que sempre a traziam para perto nos momentos de distância infinita.

 
(acervo pessoal)


segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Menina Veneno


Ela tinha a urgência e a impaciência
típicas de crianças agitadas em
véspera de Natal.

Caminhava chorando pelas ruas
qual menina imaginária e interior
lado a lado com um pai também imaginário
levando-a pelas mãos para a escola
quando preferia mil vezes ter ficado
em casa brincando em frente à TV
ou atirando coisas pela janela.

Seus olhares despertavam medo
em uns e em outros, admiração.
Era, no entanto, a paz encarnada
e infinita quando parava para respirar
entre o palavrão dito com a alma e
a risada aberta e branca que estourava
em seguida.

Parava 5 segundos.
Contemplava.
Lindificava tudo em volta dela.

Fazia tremer corações alheios.
Vasculhava olhando para cima
as janelas dos prédios acesas
na noite avançada enquanto
matava sem querer as baratas
e outras coisas nojentinhas
que insistiam em cruzar seu caminho
naquelas ruas míticas e carregadas
de passado.

Chegou até ali recusando reinos e cortiços.
Ria dos deslizes e tropicões dos outros
até perder o fôlego e a compostura
mas sem nunca perder a força,
a razão e a consciência de aprender
sempre com seus próprios tombos.

Sabia muito de si e estava
feliz com isso.
Se amava, afinal.

Amava o fruto de seu ventre
como o dia que sempre clareava
renovando tudo, inclusive
o medo e a coragem que guiavam
seus passos mais que decididos.

Era preciso passar por tudo aquilo.
Passará.
De nariz erguido.

"...um abajour cor de carne...
um lençol azul..."




sábado, 28 de novembro de 2015

Avenida Amazonas


Com os pés calejados e
cheios de bolhas.
ando com vontade
e à vontade pelo centro
da cidade.

Encaro de frente seus sujeitos
escolho seus predicados
ouço bem os substantivos
e enxergo em cores fortes
os seus adjetivos.
Miro e dobro suas esquinas agudas
e também as simplesmente retas.
Subo suas ladeiras e cruzo aos pulos
as sarjetas imundas, afluentes de seus
vários rios hoje encaixotados.

Penso muito nos beijos dela e
tudo ajuda a dissipar as dores
e as perdas que vem das
escolhas que faço.

Escolhas que me tiram a paz
me balançam e me reconstroem.

Diariamente.

(Acervo pessoal)














sábado, 21 de novembro de 2015

Sufoco


Tenho um poema para ela
Entalado na minha garganta
Com palavras bloqueadas
Por pudor
Por razão
E por respeito.

Tenho um poema para ela
Entalado na minha garganta
Com palavras calculadas
Sem pudor
Sem razão
E sem respeito.

Eu tenho um poema
Entalado na garganta.
Sai! poema...

Melhor não.


sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Sexta-feira, 13 de novembro


Abro a janela para que o som da chuva pesada dessa noite quente abafe o som de meu peito que late insanamente pensando em corações que não me pertencem.
Estão distantes e inacessíveis.
Penso somente em mim e também estou inacessível.
O rio Doce já não corre mais. Morreu afogado em si mesmo ao invés de fugir para o mar como sempre fizera.
Paris nunca me emocionou. Minha filha, hoje pela manhã, disse que seu sonho é morar lá para estudar desenho e que quando for me levará junto.

(Joana Lessa Campos-12/05/2011)


segunda-feira, 9 de novembro de 2015

quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Ainda aqueles olhos castanhos


Não sei o que aqueles olhos tem
que tanto me desconcertam
expulsando abutres de meu estômago
lançando nele borboletas
and nasty thoughts about
the birds and the bees...

Talvez sejam castanhos demais
cristalinos demais
a ponto de espelhar o céu
revelando em cada mirada
sua poesia tatuada na alma
nas vísceras
no DNA
Amém.

Aqueles olhos...
Até hoje não sei de que cor eles são.


segunda-feira, 26 de outubro de 2015

BJNBC


Era um código que utilizavam.
Uma espécie de senha
Sinal de carinho
Sinal de coragem
Chave para serem felizes
Por um micro-momento.

Era dito em idioma próprio
Que dispensava o uso de vogais
E que tornava-os sempre
Consoantes
Consonantes
Ressonantes.

Nunca reticentes.


quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Na medida certa


Uma noite calma e relativamente
bem dormida,

a mensagem de bom dia, singela e poderosa
que chegou pelo celular,

o fluir de um trabalho justo e sob controle,

a serenidade que vem com a certeza de
estar no caminho certo,

a convicção de estar fazendo a sua parte,

o alívio de um novo contrato assinado após
meses de negociação,

e, finalmente, o assoviar do vento forte que derruba tudo,
trazendo primeiro o frescor e depois a chuva que lava
a cidade e as nossas almas.

A quinta-feira trouxe tudo de bom
tudo o que era necessário,
tudo na medida certa.


domingo, 18 de outubro de 2015

37, 38... 40 graus!


A semana passara quente
quebrando recorde de calor
e cada um deles seguia sua
viagem diária e particular.

Viviam intensamente suas próprias mazelas
o que contribuía para aumentar
mais a sensação de incêndio na mata
e hell instalado.

Ele queria transformar o tempo perdido
em trabalho e em energia produtiva.
Ela queria mudar de vida.

Ele queria que os dias fossem mais longos.
Ela queria que os dias fossem apenas normais.

Ele queria fincar bandeira.
Ela queria ir embora.

Ela queria dividir com ele alguma coisa naquela noite,
o que no princípio parecia ser apenas um silêncio
mas que no fundo era a descrença em tudo e em todos,
a velha "amiga" grisalha e pelancuda
que sempre aparecia nas horas mais que difíceis.

Ele queria abraçá-la, sem pudor.
Queria diluir a dor que ela sentia, em seus braços,
em seu peito, coração e em pensamentos positivos.
Queria, com as mãos em concha, segurar cada lado
de sua face e olhá-la bem dentro dos olhos.

Queria dizer que ela merecia ser feliz de verdade,
e por merecimento,
enquanto diria para si mesmo que, no seu caso,
ser feliz era uma obrigação.

"Alegria compartilhada é alegria em dobro.
Tristeza compartilhada é tristeza pela metade"

(arquivo pessoal)









 

domingo, 27 de setembro de 2015

O milagre de um café que virou cerveja


Se encontraram na noite anterior à do eclipse.
Temperatura alta, vento pelas costas
pessoas desfilando em público suas fantasias
ou rodando brancas danças conforme a música
que saía alta dos microfones e amplificadores.
Vendia-se artesanato, chocolates,
rosas, orquídeas e cerveja.
 
Riram e conversaram aos litros
palavras soltas, diretas ou desbocadas
conforme pedia cada assunto.

Falaram do passado e do presente apenas.
O futuro não cabia naquele momento
e não pertencia a nenhum dos dois.
 
O futuro não existe de verdade
e a vida é toda uma grande brincadeira.
É trolagem diária de alguma
esfera superior, concluíram...

Precisavam ter feito aquilo tudo.
Precisavam de ar.
Precisavam falar asneiras
e reviver piadas internas.
 
Ele levou para casa um resto de abraço
e de perfume no rosto e nas mãos.
Levou a paz, o prazer de viver
e um pedido quase secreto.
Levou uma dor no peito e um pesar.

Ela possivelmente levou o que fora buscar.

Na noite anterior à do eclipse
ocultaram-se ali sentimentos
e beijos.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Entorpecente


Aquelas conversas faziam bem a ele.
Sentia uma paz sem igual,
uma alegria quase eufórica
e cada assunto era levado até o fim
com um sorriso discreto nos lábios.

Via sempre um norte claro bem à sua frente
até mesmo se caminhasse de olhos fechados.
Enxergava bondade e intenção mesmo
nas palavras mais duras e sinceras.

Havia incômodo e havia cura.
Havia esclarecimento.
E prazer também.

Apesar de tudo de bom que sentia
o alarme interno disparava o aviso
anti-compulsividade:
"Aprecie com moderação."


domingo, 20 de setembro de 2015

Alvorecer


Cada estrela que se apaga
à medida em que o dia clareia
é um beijo desperdiçado e um carinho
que deixei de lhe fazer durante a noite.

O sol que nasce dentro em pouco
clareando o mundo
é a soma de todos os outros beijos
dos carinhos que nos permitimos desfrutar
e também das palavras proferidas
ao pé de ouvido quando já não
havia mais nada para dizer.


sexta-feira, 18 de setembro de 2015

18 de setembro


O dia era azul.
Azul sem nuvem.
Havia vento, frescor
barulho de folha e árvore
sons de paz.

Pensava nela sempre
nas horas de quietude e
contemplação.
Lembrava tudo que ela tinha de perfeito
e também do que não tinha.
Lembrava do sol faiscando
palavras e sorrisos inevitáveis
a cada vez que se falavam.

Nutria ainda desejo imenso pelo seu toque.

Um bem-te-vi escandaloso
corrente e placa
o trouxeram de volta ao mundo
em tempo de não se estabacar
no chão poeirento.

Tropeçava em prioridades outras...














segunda-feira, 14 de setembro de 2015

Um desejo


Quero encerrar nossas conversas
enviando-me todo ao invés
dos "BJO" e "SE CUIDA" de sempre.

(foto: cidadeverde.com/assets/uploads/posts/dedob4.jpg)









sábado, 12 de setembro de 2015

sinto-sincro-nia


Grandes verdades vem à tona
quando nossas testas
e nossos olhos se encontram
se encaram
no silêncio de mil assuntos por ora
interrompidos
nos desejos expostos em bandeja
e na palma das almas que ali
se comunicam.

Olhares de fome e de fogo
olhares de súplica e de beijo.

Olhos nos olhos
mindsets sincronizados
agora
sintonizados para sempre.


Digitações


Porque aquelas poucas palavras
trocadas à noite em conversa informal
elevaram seu ânimo trouxeram
de volta o sorriso para a alma
e a confiança que precisava
para se aceitar em definitivo
do jeitinho mesmo que se construiu
ao longo da vida.

Seguia o bom caminho...




quarta-feira, 9 de setembro de 2015

A cidade e suas mensagens


Uma luz amarela e forte
uma igreja à espreita
na esquina movimentada
barulho
do tráfego intenso
noite de ansiedade e calor
neoclássica mensagem vital
deixada ao pé da porta antiga
sob o ruído do pixo insano e burro
de tantos animais...

AME +

(BH: esquina de Bahia com Bernardo Guimarães)














sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Aquela que ficou


Ele a achava linda demais
e motivos para isto tinha de sobra,
mais do que seus dedos poderiam
enumerar
mais ainda do que os dedos deles dois
somados
contando-se mãos e pés.

Era toda linda, de fato, mas simplesmente
porque dentre todas as que passaram
por ele foi a única que realmente ficou.


terça-feira, 1 de setembro de 2015

Questão de Tempo


Chegou um tempo de escassez tamanha
em que um beijo salvaria o dia
e um oi salvaria a sua vida.
Alguém bateu e ela, imóvel e
travada não atendeu.
Surgiu um bilhete por baixo da porta:
"Oi, vou-me embora amanhã cedo. 
Passei aqui para te dar um beijo."











segunda-feira, 31 de agosto de 2015

O que se leva da vida


Voltei de Montes Claros ontem à noite (30/08) e a cada vez que fechava os olhos tentando dormir no ônibus era esse sorriso da foto que me aparecia na frente.
A cartinha eu ganhei na festa do Dia dos Pais da escola dela, motivo de minha ida.
Como valem a pena essas viagens para ver a Joana! Essa em particular me trouxe uma clara sensação de crescimento, tanto meu quanto dela.
Dói morar longe mas vamos nos adaptando e são momentos como esses, de reencontro e evolução que levamos para a vida toda e até mais além.
A vida segue!
Te amo filhotinha!


sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Ando Farto


Pela segunda vez na semana ela invade os meus sonhos
e a persigo por toda a cidade em busca de atenção.
Isso me aborrece pela incompletude de sentimentos
e pela incompatibilidade com o mundo real.

Ando farto de sonhos vazios.

Observo pela janela um bem-te-vi
pardo, amarelo, branco, preto e mudo
pousado num galho seco
em cuja ponta equilíbra-se a lua
recém saída de meu horizonte limitado
por céu, nuvens, igreja cinza e árvore.
Torço para que continue mudo assim
e que não voe,
que não balance o galho
despencando a lua no asfalto
quebrando o encanto,
bringing you back to life.

Ando farto de devaneios.













Queria ter


Eu queria ter a sua luz e a sua energia
     queria ter a sua inteligência ímpar
     queria ter a sua cabeça vivida
     queria ter a sua opinião rasgada
     e a sua língua afiada.

Eu queria ter a sua coragem de brigar
     queria ter a sua fé quase inabalável
     queria ter a sua objetividade nua e crua
     queria ter a sua precisão cirúrgica
     e a sua força de vontade brutal e tectônica.

Eu queria ter o seu foco
     queria ter o seu braço
     queria ter o seu peito
     queria ter a sua raça
     e a sua verve bendita.

Eu queria ter o seu olhar de seta e a sua
respiração ofegante na hora da raiva
e do amor.

Queria seu desprendimento e a sua independência
típicos de quem só os tem como única opção de vida.

Queria renascer como você renasce a cada amanhecer
mas não quero que renasça em mim
a cada vez que vasculho o fundo
de meu infinito pântano particular.

Saber que você existe atiça meticulosidades.
Saber que você respira só me preenche de vazios.
Saber o que você é para mim celebra descobertas.




sexta-feira, 21 de agosto de 2015

21 de agosto


O entardecer de hoje em Belo Horizonte
tem a cor que imagino
vejo
e gosto
em seus olhos.

Nas poucas nuvens altas
e no tímido clarão da lua
vejo o reflexo do que se passa além
da linha do horizonte
para onde o sol segue sua viagem
falando outras línguas
esquentando outras terras.

Céu transparente
como seus olhos.
Me dá vontade de
mergulhar neles.













Maré


Fica em mim o teu gosto quente
e o toque congelado tempo em teu corpo.

Fica na memória de meus dedos e mãos
a textura de tua pele, nas intermináveis carícias
quilométricas por teus caminhos e trilhas.

Fica o teu cheiro de perfume, saliva e beijo
a cada mordida no pescoço oferecido em luta e suor
num mútuo puxar de cabelos.

Sou de Lua.

Às vezes te amo.
Às vezes esqueço.

Às vezes recomeço e findo.
Vou e volto.

Arrebento-me ondas na areia branca.


terça-feira, 18 de agosto de 2015

Rosário


Não sabia ainda o que aqueles desenhos
que agora fazia queriam dizer:
talvez as fotos, instantâneos de um mundo
corrido e louco já não tivessem tanta força
e a poesia, esta atávica e imemorial já
estivesse perdendo o viço e o propósito.

Angustiado, contorcia as mãos em bola,
roía mal as unhas, fazia delas alfinetes,
coçava e arranhava nervoso canelas,
antebraços e as costas nuas depois
da corrida diária na pracinha do bairro.
Brotavam micropontos de sangue na pele feito
contas de um rosário de expressões a desfiar
ou como as flores das sempre-vivas
que aparecem em cachos redondos
nas serras por aí.

Não sabia ainda o porquê
de tanta expressão,
de tanta música nas madrugadas,
de tanta insônia,
de tanto bruxismo.
Não sabia que sabia
escrever coisas com as luzes
todas apagadas.

Talvez quisesse alcançar de novo
um coração desconhecido,
talvez alcançar de novo o desconhecido
que ainda habitava em seu coração.

Queria eliminar de vez esse
talvez e também as reticências
em sua vida.












sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Silva - "Cansei"


Essa música merece um post no blog pois tem o espírito dos sentimentos que aparecem por aqui de vez em quando.

*Lúcio Silva de Souza, mais conhecido pelo nome artístico SILVA, é capixaba de Vitória.
Cantor, compositor, produtor musical e multi-instrumentista, ficou conhecido após o lançamento do seu primeiro álbum Claridão em 2012 pela Slap. Em 2014 lançou seu segundo álbum Vista pro Mar pela Som Livre.
É um dos talentos em franca ascensão na MPB.



CANSEI

Cansei de ser eu mesmo
Me deixa ser você
A vida não perdoa
Quem quer se reescrever

Cansei dessa rotina
Já não ouço o mesmo som
Cansei desse negócio
De tentar ser bom

Cansei dos meus retratos
Da falsa sensação
De ter você por perto
Não seu coração

Não me olhe desse jeito
Retoque seu batom
A sua vaidade
Faz parecer tão bom
Faz parecer tão bom
Faz parecer tão bom

Cansei dos mesmos rostos
Dessa repetição
Me deixa ser o centro
Da sua distração

Cansei dos inquilinos
Da minha solidão
Olhar você dormir
Não é compensação

Cansei da velha ideia
De segurar você
A reta do inseguro
Acaba na TV

Me entregue este controle
Me entregue a alma então
Amor você parece
Disco arranhado em vão
Pura repetição
Disco arranhado em vão
Pura repetição
Pura repetição

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

C'est la vie


O menor sinal de vida que ela dava
detonava nele um processo monstro irreversível:
sua alma inteira luz saía por cada poro do corpo,
expulsando de lá as traças que roíam buraquinhos
em várias páginas vividas e já prontas
de um livro marrom escrito a quatro patas
com o velho medo de abrir a boca
e a solidão que isso gerava.

Compunha músicas agora,
escrevia poemas,
tratados sobre navegação,
erguia templos de mil anos,
era barroco e modernista,
traçava rotas da seda,
reconhecia todas as constelações do céu,
percorria o Caminho de Santiago todo santo dia,
dizia-se amadurecido e até criticava os telejornais.

Enrolava-se porém nas contas feitas no Q.V.L.,
nas equações de segundo grau,
no refrão da música favorita cantado aos gritos
na acústica mentirosa de um banho quente,
na quantidade exata de pó para o café das visitas,
no momento certo de sinalizar para o taxi
ou de atravessar a rua sobre a faixa de pedestres.

Gaguejava sempre
ao planejar dar a ela um simples "oi"
ou ao tentar descobrir o timing preciso para o adeus,
pois sabia que a ruptura é sempre um momento de dor,
necessário, porém triste.

Enfim...



segunda-feira, 10 de agosto de 2015

(re)Verso e Prosa


Ela sentia-se sozinha
em meio a todas as coisas que construíra
na densidade da profissão fonte de decisões inapeláveis
na energia da humanidade que a cercava com caras e bocas
mas que fluía limpa e pura de dentro do seu coração gigante.

Ele sentia-se sozinho
no vácuo momentâneo de um trabalho duvidoso
no éter de pensamentos longos e estradas ainda a percorrer
na energia da humanidade que dele emanava plena
e da qual sempre procurara se esquivar.

Sentiam-se sozinhos em suas escolhas.

Eram iguais nas diferenças e angústias compartilhadas.
Falavam abertamente sobre assuntos fechados e coisas
comuns aos seus respectivos corações.
Olhavam-se de perto com respeito quase cego e depois
viravam-se para o lado para dormir o sono digno dos justos.

Em camas separadas.


sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Lila (Carlos Lascano)


Esse filme é lindo e talvez reflita o espírito que gostaria de alcançar com o meu "Ponto de Fuga".






sábado, 1 de agosto de 2015

Ipês


Roxos
Amarelos
Rosas
Brancos

Os Ipês são como os
Amores de verdade:
Nunca tornam-se árvores comuns
Quando despem-se de suas flores
Pois sabemos exatamente
O que esperar deles
Na próxima estação.














terça-feira, 28 de julho de 2015

olhos de âmbar


cristalina nascente
de amores inenarráveis
óbvias poesias incomuns
impossíveis de escrever
ou descrever
por serem olhos apenas
para os olhos do mundo todo

menos para os meus


segunda-feira, 20 de julho de 2015

Baú de Afetos (ou Amor de Índio)


Abro o meu baú de sentimentos da vida inteira
escondido no sótão onde moram apenas
pensamentos bons e as lembranças
que valem a pena.

Retiro dele:

um abraço eterno de validade retroativa,
interminável encontro de sentimentos
desencontrados;

um cheiro seu, perfume vidro de bola
impregnado em meu corpo desde sempre
e volátil como um fantasma ao sol;

a sensação de ter novamente meus dedos
misturados aos cachos de seu cabelo vermelho
e molhado, de banho ou de suor;

a visão de um trecho de seu corpo,
reclinado e branco, facho de luz lua cheia
entrando pela fresta da janela semi aberta;

e finalmente um beijo do nada, inesperado e bom
no alto de minha cabeça, batizada agora
com um pouco de gloss e ternura desmedida.

Cabeça que nunca mais foi a mesma depois de
ter guardado tudo isso para sempre dentro do
meu baú de afetos.

"O destino que se cumpriu, de sentir seu calor e ser todo..."


(Ataíde Miranda - Exalando amor entre mais de 1000 corações)





sexta-feira, 17 de julho de 2015

Eu Via Rua da Bahia


Começa na Floresta, é verdade
O lugar das ruas-cidades
Januária com Pouso Alegre
Norte e sul de Minas
Seguindo até Liberdade.
                                                  O Conde de Santa Marinha
                                                  Por ali construiu sua casa
                                                  Que tem até camarinha
                                                  Ladeando a estrada de ferro
                                                  Pra que pudesse ver a linha.
Mais à frente o Ribeirão
Morto de poluição
Vem descendo rapidinho
E variando a direção
Corta a Praça da Estação.
                                                  O trecho plano é caldeirão
                                                  Onde o povo se amontoa
                                                  Uns fazendo, alguns à toa
                                                  Lá tem muita gente boa
                                                  Exercendo a profissão.
Carijós marca a subida
Tamóios sem tacape
Viaduto, Sulacap
Passamos pelo Parque
Com a Avenida em destaque.
                                                  O Maleta se ergueu
                                                  Bem ao lado de um museu
                                                  No setor tradicional
                                                  Boemia sem igual
                                                  Bar do Ponto, Odeon, Parc Royal.
Vem subindo a Bahia
Aparece a Academia
Com seu belo casarão
E a Igreja calma e fria
É o refúgio do cristão.
                                                  Outra vez a rua é plana
                                                  Mas nos dias de semana
                                                  Quando o tráfego embanana
                                                  Menos tensa a gente fica
                                                  Pois a vista gratifica:

                                                  A Sucata se insinua
                                                  Izabela cruza a Rua
                                                  E o edifício caprichoso
                                                  Ajudou a ser famoso
                                                  O arquiteto sinuoso.
O caminho segue em frente
Surge o Minas de repente
A fachada que ostenta
A parábola cinzenta
É oásis, quando esquenta.
                                                  E a Bahia vai-se embora...
                                                  Já se avista sem demora
                                                  Verde rua Carangola
                                                  E a avenida do Contorno
                                                  Que vira, gira, enrola...

(1994)

.

Amor de Lua


Teu desfile inesperado por ruas virtuais
Bem debaixo de meus olhos viciados
Em noite intensa lua cheia
Faz minguarem as minhas desculpas esfarrapadas
Faz nova a minha esperança de te encontrar na santa paz
Faz crescente o meu desejo de estar junto
De te ver sempre de perto para sentir
Novamente o teu perfume de céu estrelado
E receber na boca teu beijo meteórico afeto

"As coisas ditas só uma vez morrem inéditas"
N.Rodrigues 

.

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Hashtag Qualquer Coisa


Ele escolheu a caneta errada
Para escrever naquele dia:
Tinha a ponta fina e estava quase sem tinta.

Ainda assim encheu-se de ânimo,
Armou-se com a coragem de sempre,
Insuflou nos pulmões descansados todo
O ar da sala, da casa e do bairro
Onde se encontrava.

Como parte da tática infalível para
Antecipar seus muitos descaminhos
Já foi dando um tiro no próprio pé.
Guardou sua língua de trapo na caixinha
De marchetaria espanhola como peça que era
Daquele jogo de xadrez ainda em curso.

Fez chover granizo do céu de sua boca,
Assoprou para longe a bruma que cobria
Suas pupilas dilatadas pelo uso do colírio errado.
Limpou, degrau por degrau na escadaria da Penha,
A lama grudada nas solas das botinas de couro
Que calçavam seu corazon espinado.

"Partiu para o abraço
Numa alegria incontida."













.

sábado, 11 de julho de 2015

A Ilha Vista de Fora da Ilha


Subi a serra hoje para respirar,
Observar Lanzarote por outro ângulo,
Ver de perto as estrelas e, quem sabe
Tocá-las com minhas próprias mãos.

Andei descalço pela avenida interminável reta
Perdendo a conta das vezes em que os tampos dos dedos
Se foram em meus tropeços por suas esquinas graníticas.

Pisei tapetes de flores dos Ipês
Espalhadas pelas calçadas e beiras de asfalto
Atenuando a rush hour e o meu coração acelerado.

Desisti de contar pelo caminho
Os inúmeros anúncios de vende-se ou aluga-se
Estampados nas janelas de casas, prédios, lojas
Caras, bocas e corações transeuntes em plena crise.

Cheguei ao topo e lá do alto
Vi a noite caindo
A cidade se acendendo
As pessoas se emocionando
E o firmamento se iluminando.

Toquei finalmente o céu com as mãos
Colhi buquê de estrelas
E desci com ele para dar à moça
Que vive com os pés no chão
E não acredita mais em sonho.













quinta-feira, 9 de julho de 2015

Transdelírio Distópico


Acordo de um sonho doido meio noir
Em que via apenas seus olhos
Iluminados e em faixa
Refletidos no espelho retrovisor
Do carro que você guiava
Pela madrugada adentro
Numa época que nunca vivemos.

Sentia uma paz improvável
E também o peso de seu corpo
Deitado sobre o meu retesado,
Solto no éter, no álcool e no céu de sua boca
Que desferia-me beijos infinitos e
Dizia-me coisas ao pé do ouvido
Em idioma incompreensível,
Em língua estrangeira ou alienígena
Da qual só reconhecia duas palavras:
Amor e coração.

Adormeço de novo.
Continuo vendo seus olhos e as reações
De sempre pelo retrovisor
De sonho, beijo e duas palavras mais.
E com seu corpo ainda sobre o meu,
Sem pesar.

.

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Blessed


Então, na lanchonete ela fala:
"...papai, olha que lindo! O guaraná parece o sol derretido..."

Mais emblemático do que sentir sua mão
Ficar maior dentro da minha
A cada visita
A cada reencontro
A cada passeio pela cidade

Mais prazeroso do que ver em seus olhos a pureza
Das pequenas grandes alegrias infantis
Relatadas sempre em saraivada de palavras a mil por hora

Mais desafiador do que sentir bater a "paura"
De suas incertezas de criança madura antes do tempo
E procurar a palavra certa para o conforto que a hora pede

Mais surpreendente do que ouvir
Suas opiniões cada vez mais fortes e embasadas
Durante nossas intermináveis conversas na Praça da Liberdade

É observar, com imensa alegria
Nascer aí dentro a poesia
Natural e cotidianamente
Ao longo de nossas muitas falas
Em nossos muitos momentos juntos
Como se já não bastasse reconhecer em você, minha filha,
O maior de todos os meus poemas...

E para o boa noite, ela disse baixinho:
''...papai, o seu colo é muito bom mas o travesseiro é feito de nuvem..."
Deitou-se de lado na cama e dormiu. 














Ontem,  04/08/15, voltando do centro da cidade a pé e conversando com Joana pelo telefone enquanto subia a rua de casa ela me disse: 
"...papai, estou notando que você está com voz de homem suado..."

(em 29/07/15 acrescento o seguinte artigo:  http://www.contioutra.com/a-educacao-do-ser-poetico-por-carlos-drummond-de-andrade/)


quinta-feira, 2 de julho de 2015

Mundo das Coisas


Uma orquestra de cordas
E alguma percussão
Tocando em loop repertório
De gênios esquecidos.

Uma pequena flor amarela
Que insiste em brotar
No meio da aridez fértil
De una calle empedrada
E a alma, como saveiro branco
Solto à sorte na maré cheia.

Mil beijos lançados ao vento,
Um sinal de aceitação,
Paz e suavidade em desejo
Deixados lá fora ao pé do mistério
E banhados pela luz da lua que reina
Redonda e absoluta na madrugada fria.

No fundo no fundo, só consigo mesmo pensar em uma coisa:
Depois que morrer, vou sentir uma falta danada de ouvir música boa.

.

terça-feira, 30 de junho de 2015

Toque Solar


Ela me dava seu carinho.
Ela me dava seu amor.
Seu toque arrepiava e aquecia
Todo o meu corpo da cabeça aos pés,
Lenta e gradualmente
Como o sol de inverno
Me aquece agora deste lado da rua,
Nesta calçada comprida e larga
Que percorro pari passu com a poesia,
Indo para além de onde a vista alcança
Ou até que caia exausto e de joelhos sobre o meio-fio
Limite entre razão, lembranças e circunstâncias.

Nosso silêncio dizia mais
Do que tudo que nos desejávamos
Em tempos de paz.
Nossos gritos de guerra
Nos feriam, deixavam
Sinais de pólvora por nossas muitas mãos,
Detonavam bombas, abraços e beijos
Violentos e ensurdecedores
Dentro da trincheira de nossos lençóis
Rotos e puídos pelo conflito intenso.

Depois, mais silêncio, rostos colados, olhares incrédulos
E fixados no fardamento espalhado pelo chão
Prestes a sumir, levado pela enxurrada da chuva intensa
Que caía sempre para diluir nosso suor e suas lágrimas
Em momentos de despedida e lama.

Eu, com lágrimas tardias e quase secas
Tentava apagar memórias de guerra e paz
Percorrendo as calçadas iluminadas de inverno,
Buscando encontrar nelas alguma razão
E o calor perdido de seu toque solar.

.

Soltando os Bichos I


É um monstro dentro de uma caixa,
Uma coisa adormecida
Um desejo reprimido
Morando agora debaixo da minha cama.

Bicho estranho que só anda aos pares.
Preto
Manchado
Pesado
E leve também.

Cheguei em casa com eles ontem
Na cabeça e nas mãos,
De corpo sedento e alma resoluta
Disposto a me entregar finalmente
Mas evitando encará-los de frente.

Sombra prestes a me levar,
A me seguir talvez guiar
Passo a passo para experiências
Sempre negadas e desconhecidas,
Ou simplesmente novas,
Inaugurando buquê das coisas
Que nunca fiz
E que se tornaram inadiáveis.

Sejam bem-vindos, tênis de corrida!

.

domingo, 28 de junho de 2015

Foi Bom!


Partiu pra casa correndo como um Road Runner
Seco que estava para abrir sua última Ice geladérrima,
Saciar seu paladar infantil
E temperar assim todas as palavras boas que acabara
De ouvir vindas de quem nunca imaginou
Ser capaz de dizer nada daquele tipo ou
Daquela maneira depois de tantos anos.

Não entendia o dia frio
Quente agora,
O azul profundo do céu
Totalmente cinza há 5 minutos,
A perspectiva de muro de concreto a um palmo de seu nariz
Transformada em vista amanhecer no Pico da Bandeira
A um simples giro sobre seus próprios calcanhares
No começo da desabalada carreira.

Queria decifrar aquilo tudo num gole ou dois,
Degustar a glória momentânea,
Retribuir ao mundo na mesma moeda
E se embriagar de vida
Ainda mais.

.

terça-feira, 23 de junho de 2015

Hoje o Samba Não Saiu


Enxergava a vida e o mundo
Como um quadro de Afremov
E cantei sambinha mesmo,
Feito de uma nota só.

Nota só era de noite
Nota só era de dia
Nota só incomodava
Atravessei a melodia.

Nota só era danada
Foi pro samba proibido
Foi pro samba em disparada
Foi pro samba sem partido.

E o samba não teve grita,
Não teve choro não teve vela
Do Noel mesclei a fita
Com uma tal flor amarela. 

.

segunda-feira, 22 de junho de 2015

Depois da flor, um coração


"Oi."
Disse ela depois de alguns dias de silêncio.
Ele reconheceu a voz e respondeu semicerrando os olhos
Sem tirá-los, no entanto, da flor cremosa desenhada
Na espuma do capuccino que acabara de pedir.

"Ei!."
Verbalizou após alguns segundos.
Fingiu surpresa com o encontro, pois sabia
Que cedo ou tarde a veria por aquelas bandas da urbe.
No fundo da alma ele quis dizer:
"Ainda bem que está aqui! Aquela música me angustiou, me fez pensar que nunca mais nos veríamos..."

Conversaram e se atualizaram sobre coisas da vida.
Ela não pediu nada para beber.
Estava com certa pressa e por isso ficou
Meio assentada, meio de pé,
Com o cotovelo esquerdo apoiado no balcão de madeira.

Ele sorvia aos poucos a bebida,
Olhou-a de frente, inteirinha.
Descobriu uma novidade para contar.
Riu de algumas graças em comum.
Viu e apontou para um conhecido de ambos que passava perto.

Não se lembra de mais nada que aconteceu naquele dia
Depois que, ao fim do derradeiro gole, ela mostrou sorrindo
Que a xícara meio vazia, ostentava em seu interior
Um formato perfeito de coração.

.

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Junho


Manhã de azul intenso e sol tentando
Em vão aquecer a cidade acordada,
Viva e indiferente aos pecadinhos e mazelas
de quem leva a vida a sério demais.

Seu trabalho transcorre ao som
De Gershwins salvadores
Vomitados ouvido adentro
Pelos fones em volume dez.

Lá fora o carro da pamonha
Vocifera gordices a preços módicos
Enquanto passa voando
Um camburão da polícia.

Um rádio estridente diz ao longe
Notícias um tanto genéricas
E fala da queda do helicóptero.
Alguém desce a rua tossindo roucamente.

A brisa entra pela janela murmurando sonhos,
Assume ares de vento e faz roçar as cortinas
No espaldar alto das cadeiras
Da sala de jantar.

Movimentos de maré,
Ondas espuma branca
Indo e vindo
Na arrebentação deserta,

Dorso de dedos em ação,
Carinhos no rosto da mulher preferida.
O único som que realmente escutava
naquele momento.

Manhã de azul intenso e sol.


quarta-feira, 17 de junho de 2015

Um Momento


"Gosta de carinho?" Perguntou ele.
Ela olhou para baixo e, imediatamente, uma mecha de cabelo cai sobre sua testa e olho direito.
"Senta perto de mim!" Insistiu ele.
Ela, imóvel, sorriu discreta.
E aconteceu.

.

segunda-feira, 15 de junho de 2015

Dança dos Óculos


Para se enxergarem melhor,
Os óculos.

Ela os colocava.
Ele os tirava.

Os dela combinavam
Com seus olhos castanhos
E com o céu mais azul do mundo
Refletido nas lentes quase planas,
Janelas de quem enxerga longe,
Abertas também para um vasto mundo interior.

Os dele ficaram em cima da mesa
Com suas hastes braços cruzados.
Seus olhos ficaram nus
Como seus pensamentos e momentos.
Janelas para seu coração e sua alma,
Um pouco confusos com tanto sentimento.

Enfim ele se acalmou e ficou
Feliz em se ver refletido
E fundido naqueles vidros

Meio olhos castanhos
Meio céu azul
Meio sereno
Meio universal

Inteiro admiração.

.

domingo, 14 de junho de 2015

Na Medida do Desejo


Qual é a medida do desejo?

Profundo como a água das fontes
Onde jogamos as moedas
E pensamos o bem?
Ou
Profundo como um mergulho
Em mar aberto oceano
Indo até onde se apagam os raios de sol?

Seria a medida de águas
Em que vemos o fundo
E que mal nos chega aos joelhos?
Ou
A medida da total imersão
De corpo e alma
Da qual até esta sai encharcada?

Será a medida da circunferência
Dos braços em arco
De um abraço mútuo que ficou no ar?
Ou
O tempo mínimo de um carinho
Ao pé do ouvido,
Gerador de um olhar de soslaio,
Mais sorriso que olhar?

Qual é a medida do desejo?
Isso não importa.
Desejo é desejo.
Se o alimentamos, ele cresce.

.


sábado, 13 de junho de 2015

Maria


As Marias que conheço
Ventam,
Se reinventam,
Giram rodas,
Furacões.

As Marias que conheço
Se sustentam,
Se complementam
E são várias,
Como as Minas de Guimarães.

Maria tem força,
Tem graça,
Tem gana sempre
Tem belos e irresistíveis
Olhos castanhos.


sexta-feira, 12 de junho de 2015

The Living City I


Personagens: Narrrador, Moça 1, Moça 2, Moça 3, Moça 4.

Local: avenida movimentada perto do shopping.

Fim de tarde. Hora do rush.

O anel grosso de prata
Cai da mão de Moça 1
Quica no meio fio e rola
Metálico e cambaleante
Até o meio da faixa de pedestres.

Moça 1 e Moça 2 olham-se nervosas
E soltam exclamação abafada e simultânea.
O sinal está vermelho para elas.

Vem sequência de carros:
um passa longe do anel,
outro passa por cima sem tocá-lo,
o terceiro passa com a roda bem perto e ele treme.
Moça 1 e Moça 2 também tremem e se tocam nervosas.

Moça 3, do outro lado da faixa
Atravessa correndo antes do quarto carro
Passar voando, de faróis apagados.
Sem perceber chuta com força o anel
Que vai parar nos pés de Moça 2.
Ela grita, o apanha e entrega para Moça 1.

O sinal abre e elas seguem rindo alto
Com historinha na manga para contar em casa
Mais logo, no intervalo do jornal ou da novela.

Narrador observa tudo sério, calado,
Sem parar de pensar em Moça 4,
Que nada tem a ver com a história
Está em outro ponto da cidade
E tem lindos olhos castanhos claros.


.

Um Poema Perdido


Às vezes não adianta mesmo!

Por mais que haja felicidade
Por mais que haja inspiração,
Esperança e vontade de escrever

Os poros fecham-se
As pontas dos lápis quebram-se
As canetas entopem-se
Os dedos encolhem-se
Os teclados travam-se
O blogger dá biziu.

O que era para vir poesia
Assume tudo que é forma
Menos poema, não havendo

Adélia
        Drummond
                        Neruda
                                  Leminski
                                               Pessoa

Qualquer para salvar a noite.

No desespero da causa
Invoco sol de primavera
E recebo em troca um beijo seu,
Etéreo, partido e equatorial:

"...Você olhou sorrindo pra mim / Me acenou um beijo de paz / Virou minha cabeça / Eu simplesmente não consigo parar / Lá fora o dia já clareou..."

O coração, no entanto, continua batendo.


.

quinta-feira, 11 de junho de 2015

Na Praça ao Pé da Serra


Eu à noite na praça
Ao pé da serra
Paredão negro às costas
E lá embaixo a cidade
Espalhada em ondas
Mar de luz
Vasto mundo
Mundão.

Alguma luz dali é ela,
Certamente ela,
Solta em meio à multidão
De pontos brilhantes
Da vista desse horizonte belo.

Quando em surto delírio
Surpresa!
Da vista uma luz se solta
Me invade o coração.
Me abre os olhos
Me enxerga
E me eleva a condição.

Me preenche me percebe
Consciente.
Diz que uma luz apenas
Não é ela
É toda aquela  multidão.

.

terça-feira, 9 de junho de 2015

Encontre-se (ou o amor revisitado)


Por muito tempo
Pela falta de fé
Ou pelo excesso de certeza
Acreditei que no amor
Os opostos se atraíssem.

Considerei
Narcisismo
Egoísmo
Querer me encontrar
Em outra pessoa.

Pensamento de quase
Década.

Amor não se mede.
Amor não se classifica.
Amor não se teme.

Não é errado encontrar-se
Em alguém
Desde que já tenha
Se encontrado
Em si mesmo.

Encontre-se
No carinho e na ternura.
Sempre.
No recado deixado ao lado
Da xícara preferida
Logo pela manhã,
Ou no link da música
Enviado pelo whatsapp.

Encontre-se no alvoroço
Dos lençóis amarrotados
Suados e surrados à noite
Ou em qualquer hora.

Encontre-se
No silêncio das palavras
Proferidas pelos olhos
Fechados
Na hora do beijo e
No aperto do abraço.

Encontre-se na companhia
Pura e simples das pessoas
Essenciais.

Encontre-se no risco
E na certeza de entregar-se
Àquilo em que acredita
E intui.

Go ahead!
Encontre-se inteiramente em alguém.
Ou em partes,
Em pensamento,
       espírito
       olhares
       sorrisos
       gestos
       atitudes
       cheiros e lembranças.

Não desconsidere os sinais
Que a vida oferece.

No amor
Os opostos não se atraem.
Os semelhantes se encontram.
Encontre-se no amor
E cuide-se bem.




sábado, 30 de maio de 2015

Manhã (e vento) de Maio


Pousei a testa latejante
Na bancada fria de granito
Para ouvir de perto
O tilintar das gotas que caíam
Da torneira mal fechada.

Fechei os olhos
E murmurei versos
De uma canção
Que sempre traz
Você de volta
Embora saiba bem que
Não se lembra mais
De mim.

Assim mesmo, não parei de cantar.

Fiz do som daquelas gotas o som
De seus passos me rondando
Querendo fazer ou dizer algo e recuando,
A cada suspiro meu.
A cada suspiro seu.

Fechei a torneira ao sentir
Seus dedos tocando de leve
Meus cabelos quase úmidos,
Um beijo feito de vento frio
Em minha têmpora aberta,
Uma voz em dueto comigo
E um rastro quase imperceptível
De seu perfume preferido indo embora.

Quando abri os olhos
Paramos de cantar
E não mais vi você,
Naquela manhã atípica
Do mês de maio de 2015.


quarta-feira, 27 de maio de 2015

"Livros em Pauta" - 5ª Edição


     No próximo dia 30 de maio acontecerá em São Paulo a 5ª edição do Evento "LIVROS EM PAUTA". “Congresso de Literatura, quadrinhos, RPG e outras mídias nerds

     Nesse evento, haverá palestras e debates gratuitos, além de feira de livros, quadrinhos e memorabilia nerd. Também haverá os lançamentos dos seguintes livros: LEGADO DE SANGUE, DE REPENTE NÓS, IMAGINARIUM, VIAGENS DE PAPEL, SEDE, KING EDGAR HOTEL E ALÉM DAS CRUZADAS e AS QUATRO ESTAÇÕES, sendo que neste último aparecem dois poemas meus, já publicados aqui no Ponto de Fuga: "Para Sempre Meu. E Seu" e "Ficamos Assim".
O evento também contará com salas com jogos de RPG.

     O LIVROS EM PAUTA foi criado pelo escritor Edson Rossatto com o intuito de promover o encontro de escritores, editores, críticos literários e demais profissionais do livro com leitores e escritores amadores, para discussões sérias e também para bate-papos descontraídos por intermédio de atividades gratuitas, como mesas-redondas, palestras, sessões de autógrafos e lançamentos de livros.
     Até a 4ª edição, as temáticas giravam em torno apenas de “livros e literaturas” e o evento ostentava o subtítulo “Encontro de leitores com escritores e outros profissionais do livro”. Contudo, o consumidor de livros, ao longo dos anos, passou a apreciar outros tipos de mídias correlatas, como quadrinhos, cinema, séries de tv, jogos de RPG e games. Basicamente essas pessoas consomem histórias, não importando em qual tipo de mídias elas se apresentam.
Assim, atualizando o evento para novos tempos, a partir da 5ª edição, o LIVROS EM PAUTA passou a contemplar atividades culturais relacionadas a outras mídias, adotando, então, o subtítulo “Congresso de Literatura, quadrinhos, RPG e outras mídias nerds”.

Maiores informações em www.livrosempauta.com.br







.

sexta-feira, 1 de maio de 2015

No Dia do Trabalho


Em meio ao noticiário
Sobre terremotos e
Vulcões pelo mundo,
Penso comigo
Tsunamis
Caminhando ligeiro
Ao largo do
Parque Municipal.

Passo de leve os dedos
Pelas barras de seu gradil
Verde e sujo,
Como se tocasse as cordas
De uma harpa infinita
Em que cada nota
É uma letra de seu nome
O qual você ainda nem me revelou.

Saio com os dedos pretos,
E o coração,
À simples menção desse
Nome inexistente,
Bate frio e metálico
Em panelaço contido
Pelo fôlego preso,
Talvez por dúvidas e medo,
Num dia em que teve
Trabalho a fazer.

Muito trabalho.


.

sábado, 25 de abril de 2015

Rua Sapucaí


Quando penso em você
O pensamento é reto
E planejado
Como as ruas
De nossa cidade.

Uma reta só.
Composta por lustres
E balaustres,
Ponte que liga
Outras pontes
Paralela à linha
De ferro,
Como de ferro é
A minha trilha
No mundo.

Uma reta só,
Lindeira à Estação,
Onde ficam a saudade
E o aceno interrompido
Quando o trem ancestral
some na primeira curva.
Onde as esperanças vem e vão
Assim como todas as notícias,
Boas ou não.

Uma reta só.
Uma seta
Varando meu peito.
Uma agulha
Cosendo meus
Retalhos deixados
Ao longo de suas calçadas
Infinitas.
Um olhar direto
E fulminante
Para o skyline noturno
Espectro de cidade
Explosão de vida
E barulho...

Lugar de por do sol
De sangue e ouro
Que me traz o manto
Negro da noite,
Ou de céu duro
De cimento e concreto
Que embaça o dia,
Endurece,
Porém enobrece a alma.
Antes uma Benfeitoria
Que um lamento.

Uma reta só
Direta e contundente
Como um coração partido.
Caminho de casa
E teatro de vida,
No fim de tudo.


(foto: Julia Duarte - https://www.facebook.com/juliaduartefotografia?fref=ts)



.




segunda-feira, 30 de março de 2015

Dos Meus Olhares


Tenho um olhar
Aguçado
Percebo quem anda
Ao meu lado.

Tenho um olhar
Penetrante
Percebo quem vai
Adiante.

Tenho um olhar
Perspicaz
Percebo quem chega
Por trás.

Tenho um olhar
De rapina
Percebo tudo
De cima.

Tenho um olhar
Calejado
Percebo o mal
Praticado.

Tenho um olhar
De poeta
Percebo mil curvas
Na reta.

Tenho um olhar
Hesitante
Percebo às vezes.
Durante...

Tenho um olhar
De arquiteto
Percebo o que
Não está certo.

Tenho um olhar
Paternal
Percebo de longe
Se algo está mal.

Eu tenho um olhar
Condizente
Com toda a emoção
Que se sente.

Tenho um olhar
Já cansado
Pra tudo em que sou
Viciado.

Tenho um olhar
De espanto
De choro de susto
De pranto.

Tenho um olhar
De respeito
Pro mestre que pulsa
Em meu peito.
  
No meio de tantos olhares
Percebo no riso e na dor
Que eu mesmo só guardo
Meus olhos
Para ela
Que é meu amor.











.

quinta-feira, 26 de março de 2015

Tanto Tempo


Passou tanto tempo
Só pensando nela
Que nela o tempo passou
Que nele o tempo voou
E deles nada restou.

As ruas de terra
Foram asfaltadas
As casas todas
Arrasadas
Os prédios
Levantados.

A chuva sumiu.
O clima endoidou
A paisagem mudou.
O que era verde
Ficou cinza
E o que era cinza
O vento levou.

O tempo passou
Ele pensava
E ela voou.
Tanto tanto tempo
Passou
Que o tempo lhe disse:
Lamento filhote,
Eu não volto.
Só vou...


segunda-feira, 16 de março de 2015

20º Andar


Nem desenho.
Nem poema.
Só garranchos mentais.

Pousei a lapiseira
Ao lado da folha branca
Intacta
Sobre a mesa
Imensa
Da sala de reuniões
Vazia.

Vou lá todos os dias
Depois do almoço
Para respirar.

Pensamentos em profusão
Saltam
Voam
Pela janela esquadria negra
Que contém o corpo
Que emoldura a alma
E o mundo lá fora
Enquanto ela,
O meu amor,
Lá embaixo,
Colhe todos eles
Em algum lugar
Da urbe escaldante
Sem saber de nada

Daqui de cima
Tamanho formiga
Para os olhos,
Tamanho família
Para o meu coração.





















.

domingo, 8 de março de 2015

Depois da Chuva


À noite
Sobre as poças rasas
Deixadas pela chuva
Que acabara de cair
Ele caminhava só,
43, mais adolescente
Do que nunca
Levando flores nas mãos
E na alma.

Nos ombros o peso
De um luar intenso
De prata pura
Derretendo aos poucos
Nuvens de chumbo
E medo.

Coração?
Repleto de tudo.
De vida, inclusive.

Deixou ao pé da entrada
O buquê
Deslizou com os olhos
Por baixo da porta
O cartão
Com tudo o que nunca disse
E com tudo que estava por dizer
E querer
Dali pra frente.

Sentiu ali sua presença
Pelo simples fato
De saber que ela existia,
Mais do que pelas luzes
Vindas das janelas
Pelo vento assoviando
Pelas frestas
Ou pelo trote miúdo do "pet"
Que já notara o movimento
E farejava o chão
Do outro lado daquela
Bendita porta.

Saiu andando sem olhar pra trás,
Consciente de ter feito
O que pedia a voz
Do seu coração.














.

terça-feira, 3 de março de 2015

Devaneio


Ela deixou tocar a mão
Em seus cabelos negros
E cada fio que passava
Por meus dedos
Parecia forte e pesado
Como se fosse de aço
Porém deslizava
Solto e leve
Como aquele momento
Ia se tornando.

Eu sentia um por um.

Cada fio uma nota musical
Um acorde numa sinfonia
Que nunca deve acabar
Uma batida do cuore mio
E um desejo intenso
Por seu beijo.

Cada fio uma certeza
De que vale a pena
Viver um dia após o outro
Cada momento
Cada sentimento
E cada amor.


.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Decidébeis


O som de um jato
Em voo rasante
Às onze da noite
Sobre o telhado de casa
E o som de sua imagem
Quando fecho os olhos
Ao lembrar de seu
Sorriso

Som
Iguais















.

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

O Pensamento Orbital


Girava como um planeta
Solto no espaço só que
Preso à Estrela que ela
Se tornou
Desde que ali chegara.

Os olhos gravitavam
Em torno de sua presença
De sua existência
Na urbe e
Na sala que habitavam.

E então as órbitas
Se cruzaram
Colidiram olhares em
Explosão cósmica
Big Bang
E ao
som de mil
Corações disparados.

Andou atrapalhado
Em volta da moça
Sem saber o que falar
Sem saber o que pensar
A não ser a melhor maneira
De sentir o seu perfume
Ou tocá-la
O coração.

Caiu a ficha.

Notou que fugira da vida
A vida inteira
Assim como o diabo
Foge da cruz
Andara em círculos
Parábolas e elipses
Voando tonto
Como um inseto voa
Em torno da luz.


.



sábado, 31 de janeiro de 2015

Herança


Giro com os dedos
Memórias
Assim como giro o gelo
No destilado on the rocks.

Bebo muito,
Mas aos poucos.
Me embriago
E durmo.

Sonho com o quinhão
De herança que recebi:
 
Um peixe Beta para alimentar,
Um mini-cacto para cultivar,
A face ainda úmida
Do beijo longo e filial.
A blusa amassada
Pelo aperto do abraço
Da despedida
(ou do até breve).
Alguns brinquedos
Centenas de desenhos
A visão do sono calmo e sereno
Muitas risadas
E declarações de amor.

Desperto feliz e triste,
Sem ver a hora de viajar.
Ansioso e resignado,
Com a mente tranquila
E o coração aberto
Para tocar a vida
E administrar
O latifúndio emocional
Que vou me tornando.














.






domingo, 11 de janeiro de 2015

Dez do Um


Sábado.

Sorvi em goles
Pausados e profundos
Toda a atmosfera 
Em minha volta
Alimentando e digerindo
Acontecimentos.

Minha filha vai morar longe.
Meus pais estão velhos.

O resto da família toca suas vidas
Cada qual em seu compasso.

Tenho paixões dispersas
E amores a resolver.

Não sei a quem recorrer
Para o desabafo diário
Pois nem meu travesseiro
Aguenta mais a ladainha.

Estou só mergulhado
Em pensamentos tantos
Que as noites inexistem
E os dias são pequenos
Demais para abrigar
O tanto de vida que
Ainda imagino ter.

Ao mesmo tempo
Tenho medo de não ter
Mais assunto.
Nem para autocrítica.

Enquanto isto a vida
Segue e escoa.
Rápida e certeira
Como um tiro de fuzil.


.



terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Para Sempre Meu. E Seu.


A consciência súbita
De que tudo um dia acaba
E de que a vida é uma só
Me joga na cara
A lembrança que já lhe
Escrevi poemas e nunca
Os mostrei.

E você sempre linda
E sorridente naquelas fotos...
Na confortável, astronômica
Distância que fotos infringem
Às paixões não declaradas.

Quisera eu lhe falar
De amor
Com a mesma facilidade
E coragem com que
Lhe escrevo agora
Mais esse poema.

Para sempre meu.
E seu.




Publicado em 17-06-2016 no blog da Viviane C. Moreira: https://videcampos.wordpress.com/2016/06/17/amor-em-pedacos-versos-196/


.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

Ora Pro Nobis


Todo santo dia oro para santos
Que não existem me protegerem.
Torço para que o Universo
Conspire a favor de coisas
Que não construo.
Durmo com medo do Bicho Papão
Puxar minha perna ou me aplicar
Um bullying espiritual qualquer.

Só que,
Quanto mais eu rezo
Mais assombração aparece...

Outro dia veio a Papuda
Lá dos altos do Palácio
E assustou a Joana...
E me encheu o saco!

Confiarei nossa proteção
Agora a um menino
Com nome de rei bíblico
E carinha de anjo da Turma da Mônica
E  a outro, com nome de goleiro-herói
E rostinho risonho e despreocupado...

Para sempre meus queridos.

.