"Sempre que desejo contar alguma coisa, não faço nada;
mas quando não desejo contar nada, faço poesia."
Manoel de Barros - Livro Sobre Nada

"O momento em que, hipoteticamente, você sente que está andando nu pela rua, expondo demais o coração, a alma e tudo o que existe lá dentro, mostrando demais de si mesmo. Esse é o momento em que, talvez, você esteja começando a acertar. "
Neil Gaiman - O Discurso "Faça Boa Arte"

"...eso es lo que siento yo en este instante fecundo..."
Violeta Parra - Volver a Los Diecisiete

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Sexta-Feira da Paixão

Partirei à velha cidade
Desprezando teto
Fome
Idade
Para que
Com liberdade
Decida eu
Minha vontade.

Cruzarei o mar de morros
Em galé da era moderna
Para ir a outros foros
Encontrar a luz eterna.

Aproveito a ocasião
E o pretexto tradição
Disfarçado em religião
Pra seguir a procissão
Pois enquanto ela passa
Ressuscito a devassa
E em meio à humana massa
Eu suplico uma graça.


Ouro Preto, 1995.


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segunda-feira, 29 de agosto de 2011

(Des) vegetar

Ai, que vontade
De calar,
E às vezes, de fitar
O vazio,
Esvaziar a mente,
Vegetar
Sob o sol escaldante
Sob a chuva saraivada
De coisas que podem
(e devem) mudar minha vida,
Batendo na minha cabeça
E na minha porta.

Pisco um olho.
Desvegeto.
Volto a mim e
Abro a porta
Pra um novo
movimento...


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quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Minas

Nas montanhas que cercam 
Meu peito
Nas ruas em ladeira

Por onde sobem e descem
Pensamentos
Nos adros dos templos

De onde vislumbro 
O futuro
Você é presente.


É o vento gelado 

Que corta meus vales
É o rio cristalino 

Que sangra minhas veias
Aonde garimpo seu sorriso
Seu amor
O maior de todos os tesouros
que já encontrei.





















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quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Narciso

Se o Narciso um dia voltasse
E pudesse olhar-se no espelho
Talvez não acreditasse
No quanto estava velho.

A cegueira fez-lhe um mal
Que tolheu-lhe lentamente
Uma vida sem igual
Todo o amor que tinha em mente.

Mergulhou em águas claras
Foi nadando atrás de si
Encontrou as mesmas caras
Sempre as vira por ali.


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terça-feira, 23 de agosto de 2011

Veneza, 1996

Meu inócuo coração
Mais antigo que a escrita
Quando bate crava ao chão
Uma nova palafita.

Vai erguendo um edifício
Sobre as águas de um canal
Para o qual é bem difícil
O acesso principal.

O edifício é o sentimento
Que eu guardo para alguém
E que até este momento
Compartilho com ninguém.

Só uma nova bateria
De um outro coração
É que me construiria
Uma ponte de união:

Numa margem, meu receio
Numa outra um’alma nova
E a ponte, bem no meio
É o amor que se renova.


Pássaros na laguna de Veneza - A.W. 1996















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sábado, 20 de agosto de 2011

Neon

Altaneira a flor
Participa em mim
A dor
De um grito no escuro
Um tiro no silêncio
Da noite insone.

Ah! flor,
Sempre me socorres
Em versos descomunais
Incomensuráveis
Que habitam meu
Pensamento passando
Como um luminoso de neon
Continuamente...

Ah! amor,
Quando um dia destes
Me atenderes,
Não haverá só um,
Mas “n” haveres
Ocasiões
Em que aqueles versos
Verbalizarão
Se materializarão
Em versos que só você
Vai escutar
Mesmo em meu silêncio.

Versos que serão vistos
Dentro de meu olhar.


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sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Você, quando aparece

A sua fala:
Me emudece.

O seu silêncio:
Me enlouquece.

O seu olhar:
Me estremece.

O seu toque:
Me arrefece.

O seu perfume:
Me entorpece.

O seu beijo:
Me apetece.

O seu amor:
Me fortalece.

A sua luz:
Me amanhece.

A sua vida:
Me acontece.


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quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Washington, D.C.

A menina desce da rede e à sombra das cerejeiras
Apanha uma de suas flores caídas no Mall...
Sorve-lhe o perfume e sente a brisa leve acariciando-lhe a face.

"Hard times, fast times..." diz para si mesma.

Tudo passa e a vida que começou num sopro
Enche-lhe os pulmões novamente,
Desta vez, com cheiro de flor.













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4 Estações


É outono
E agora caio
No inverno
Que me gerou
Primavera
Que é quando saio
Pro verão
Que me criou.



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terça-feira, 16 de agosto de 2011

Meandros (versão 4.0)


Murmúrios de uma vida contida...
todos os meus dias
passando diante
de meus olhos fechados
buscando um sono
que insiste em não chegar,

E eu, novamente
fazendo muitos planos,
desfazendo outros tantos,
natimortos.

Ai, que angústia!

Releio um trecho do Nava,
que consagra em definitivo
o pôr do sol de Belo Horizonte
e vislumbro novas fontes e
possibilidades.

Percebo minha vida inteira
aqui nessa cidade,
percebo ser mineiro de
quatro costados,
mineiro do quadrilátero,
Chão de Ferro mesmo!

Às vezes, mineiro demais,
protegido pelo útero
montanhoso que me envolve
ansiando pelo inevitável parto.

Eis que me vejo agora,
cheio de cavas,
túneis,
buracos,
no coração
na mente
na alma...

E os sonhos,
alguns perdidos,
desfeitos,
adiados,
maquiados...
 
De olhos fechados repasso tudo:
as virtudes,
os pecados,
o amor,
a Paternidade,
os brilhantes projetos de arquitetura,
as viagens de descanso,
a conversa final com alguém...

O quanto ando distante
de Deus e dos homens,

O quanto tenho sido
egoísta e acomodado...

E a cidade como pano de fundo.

Meandros
de uma vida contínua:
Belorizonte
Belo Horizonte

Raiz.

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segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Meu Irmão

Morar longe...
Morar onde?
Bem dentro do coração:

Aqui na esquina,
Na próxima rima,
Ou duas horas de avião.

Crescer a olhos vistos,
Ainda que os olhos
Sejam os do espelho.

Viver sozinho,
Abrir caminho,
Enfrentar o humor alheio.

Entrar na briga,
Ganhar a vida,
Conquistar a posição.

Sentir anseio,
Filho do meio,
Sem tirar os pés do chão.

Cortar o dedo,
Talhar o sangue,
E ligar para o irmão.

Chorar um pouco,
Tomar um coco,
Ir pro terraço, erguer a mão,

Sentir a brisa,
Na face lisa,
E abrir o coração,

Pra um novo alento,
A cada vento,
Que lhe sopre a emoção.

Não te preocupa,
Prosseegue a luta,
Com pulso forte, meu irmão!
Que o pai atento,
E a mãe de amor,
Pedem sempre com ardor,
Para Deus Nosso Senhor,
Proteção pra o filho vento,
Na terra de Salvador.


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domingo, 14 de agosto de 2011

Shine (homenagem à minha filha)




Diante de todo meu
Aperto e angústia
Diários,
Surge você,
Joana!
Farol de Alexandria,
Colosso de Rodes,
Maravilha do Mundo,
Que me ilumina a alma,
Recepciona meu coração-barco
na enseada de seu
Sorriso.


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Goleiros (homenagem ao meu pai)


AABB-1964


Bola vem!
O esforço,
O gemido,
O voo.
Por um instante sou igual ao meu pai:
Super Homem
Santos Dumont
Sou Ícaro
Mergulhando em sonho-céu
Com asas de cera
E com a certeza
De ser a última fronteira
De todo esse processo
Que é a minha vida...

A bola chegando
A bola passando
Inalcançável...
E a minha sombra lá em baixo.
Silêncio no mundo:
Pontinha de dedo,
E ?
A bola triscando a trave
O chão chegando.
A sombra crescendo...

Um "oooh!" ao fundo.

Salvei...

(26 de abril: Dia do Goleiro)


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quinta-feira, 11 de agosto de 2011

1994 - Franz Weissmann na Praça da Liberdade

Escrevi este texto para o jornal "Entre Riscos e Rabiscos" do curso de Arquitetura do Izabela Hendrix, em 1994. Uma época em que a cidade começava a renascer culturalmente. Na imagem, da esquerda para a direita: Luciane Missiaggia, Danielli Tavernard, Juliana Myrrha, eu, Eliane Dobscha, Flávio Agostini e Leonardo Miranda. No chão: J.R. Guaritá e Sérgio Myssior. Foto: Murilo Pantaleão.

     "Merece registro a exposição das obras do artista plástico Franz Weismann, austríaco radicado no Brasil há mais de 40 anos. Tal exposição ocorreu no último mês de agosto na Praça da Liberdade, enriquecendo mais ainda a alameda “Travessia” e revelando para a cidade um belo espaço passível de intervenções.
     Estive lá muitas vezes durante a mostra. Fiz várias observações que me ajudaram a compreender o caráter da exposição e também do local. Sem dúvida, a visita mais marcante foi quando da ida de nossa turma à praça para a aula de Desenho Industrial.
     Em meio a discussões e conversas paralelas, caminhávamos pela alameda, quando fomos abordados por um homem que começou a recitar uma poesia de amor, de sua própria autoria, creio eu. Estava trajado com um jaquetão no estilo daquele que costumamos ver nas pinturas representativas de nosso Alferes mais famoso.
     Depois de dois ou três minutos, o anônimo (seria o Tomás Antônio Gonzaga?) termina seu discurso e se retira, indo de encontro à mulher que o acompanhava à distância (seria ela Maria Dorotéia?).
     Arrepiei.
     Enquanto os supostos Marília e Dirceu se iam, tomei consciência do que realmente representava aquela exposição.
     É grande o número de pessoas que freqüentam a praça, e maior ainda o daqueles que apenas passam por lá todos os dias. O cenário é perfeito: prédios bonitos, muita cor, contrastes, perspectivas monumentais. Um belo paisagismo, enfim.
     Tudo isto, aliado à possibilidade de não apenas ver, mas também tocar e até “usar” obras – crianças subiam e desciam nas esculturas, como se estas fossem brinquedos de parque – desmitifica o artista, fazendo-o descer de seu pedestal e vir para junto de nós, simples mortais. Suscita ainda um sem número de manifestações, como aquela, do poeta misterioso.
     O evento da Praça da Liberdade nos faz refletir sobre os espaços da cidade, sua apropriação e conseqüências de tal ato. Quem não se recorda do Festival Internacional de Teatro, ocorrido no primeiro semestre? Será sempre lembrado principalmente por causa daquela companhia francesa, que literalmente se apoderou das ruas de BH.
     Pois é. A exposição de Franz Weismann marcou. A mim de um modo, às outras pessoas, de outros modos, tenho certeza. Quem não viu, perdeu.
     É este o registro."
 
Belo Horizonte, 23-9-94.


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terça-feira, 9 de agosto de 2011

Ventos

Que me venham ventos
De todas as partes
E lugares.

Que venham de
Espanhalemanha
Américas de Norte a Sul
África Ásia Oceania
Eurásia Lestásia...

Ventos dos Vales
Do Aço
Dos rios
Tejo
Doce

Amarelo
São Francisco
Mississippi
Das Velhas...

Das boas novas...

Ventos que girem
Birutas
Grimpas
Acrotérios
Que passem monastérios
E lugares bem menos
Ortodoxos.

Ventos que me falem
De tudo que acontece
No mundo e na vida.

Que soprem as velas
Que movam caravelas
E o grande catavento
Ao qual chamo coração.

Ventos solares do espaço
Que promovam mudança de eixos
Polares
Físicos
Metafísicos
Magnéticos.

Que me purifiquem
Me limpem
Me lixem
A pátina ferrugem teia de aranha.
Que me cobrem...

Quero o novo!
Quero o novo!
Quero o novo!

Gira redemoinho
Me tira do ninho!

Gira vento tornado tufão furacão
Gira a esferográfica ponta
De minha caneta
Por onde sopro meus ventos
Internos...

Giramunduniverso a meu favor!
 
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segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Nó na Garganta

Sempre trazendo
A memória clara
Do amor desejado,
Do amor conquistado,
Do amor complicado
Pelos rumos da vida
E do mundo
Tal qual ele realmente é,
Com nó na garganta e tudo,
Espero em Deus
A solução de alguns problemas.


O resto eu posso resolver
Sozinho...


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quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Barcelona



google earth


Barcelona
Te espera de braços abertos,
De sorriso aberto,
E com a alma,
Que é igual à sua,
Na palma das mãos.

Barcelona é vanguarda,
É terra,
É mar,
É ar.

É montanha e planície,
É o novo e o velho,
É a “pasión” espanhola
E o romantismo francês.

É estado de espírito...

É Miró,
É Picasso,
É Gaudí.

É Colombo apontando
O infinito.
É o que vejo
Quando te olho nos olhos:
Brilho, descoberta
E arte...


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