"Sempre que desejo contar alguma coisa, não faço nada;
mas quando não desejo contar nada, faço poesia."
Manoel de Barros - Livro Sobre Nada

"O momento em que, hipoteticamente, você sente que está andando nu pela rua, expondo demais o coração, a alma e tudo o que existe lá dentro, mostrando demais de si mesmo. Esse é o momento em que, talvez, você esteja começando a acertar. "
Neil Gaiman - O Discurso "Faça Boa Arte"

"...eso es lo que siento yo en este instante fecundo..."
Violeta Parra - Volver a Los Diecisiete

segunda-feira, 31 de agosto de 2015

O que se leva da vida


Voltei de Montes Claros ontem à noite (30/08) e a cada vez que fechava os olhos tentando dormir no ônibus era esse sorriso da foto que me aparecia na frente.
A cartinha eu ganhei na festa do Dia dos Pais da escola dela, motivo de minha ida.
Como valem a pena essas viagens para ver a Joana! Essa em particular me trouxe uma clara sensação de crescimento, tanto meu quanto dela.
Dói morar longe mas vamos nos adaptando e são momentos como esses, de reencontro e evolução que levamos para a vida toda e até mais além.
A vida segue!
Te amo filhotinha!


sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Ando Farto


Pela segunda vez na semana ela invade os meus sonhos
e a persigo por toda a cidade em busca de atenção.
Isso me aborrece pela incompletude de sentimentos
e pela incompatibilidade com o mundo real.

Ando farto de sonhos vazios.

Observo pela janela um bem-te-vi
pardo, amarelo, branco, preto e mudo
pousado num galho seco
em cuja ponta equilíbra-se a lua
recém saída de meu horizonte limitado
por céu, nuvens, igreja cinza e árvore.
Torço para que continue mudo assim
e que não voe,
que não balance o galho
despencando a lua no asfalto
quebrando o encanto,
bringing you back to life.

Ando farto de devaneios.













Queria ter


Eu queria ter a sua luz e a sua energia
     queria ter a sua inteligência ímpar
     queria ter a sua cabeça vivida
     queria ter a sua opinião rasgada
     e a sua língua afiada.

Eu queria ter a sua coragem de brigar
     queria ter a sua fé quase inabalável
     queria ter a sua objetividade nua e crua
     queria ter a sua precisão cirúrgica
     e a sua força de vontade brutal e tectônica.

Eu queria ter o seu foco
     queria ter o seu braço
     queria ter o seu peito
     queria ter a sua raça
     e a sua verve bendita.

Eu queria ter o seu olhar de seta e a sua
respiração ofegante na hora da raiva
e do amor.

Queria seu desprendimento e a sua independência
típicos de quem só os tem como única opção de vida.

Queria renascer como você renasce a cada amanhecer
mas não quero que renasça em mim
a cada vez que vasculho o fundo
de meu infinito pântano particular.

Saber que você existe atiça meticulosidades.
Saber que você respira só me preenche de vazios.
Saber o que você é para mim celebra descobertas.




sexta-feira, 21 de agosto de 2015

21 de agosto


O entardecer de hoje em Belo Horizonte
tem a cor que imagino
vejo
e gosto
em seus olhos.

Nas poucas nuvens altas
e no tímido clarão da lua
vejo o reflexo do que se passa além
da linha do horizonte
para onde o sol segue sua viagem
falando outras línguas
esquentando outras terras.

Céu transparente
como seus olhos.
Me dá vontade de
mergulhar neles.













Maré


Fica em mim o teu gosto quente
e o toque congelado tempo em teu corpo.

Fica na memória de meus dedos e mãos
a textura de tua pele, nas intermináveis carícias
quilométricas por teus caminhos e trilhas.

Fica o teu cheiro de perfume, saliva e beijo
a cada mordida no pescoço oferecido em luta e suor
num mútuo puxar de cabelos.

Sou de Lua.

Às vezes te amo.
Às vezes esqueço.

Às vezes recomeço e findo.
Vou e volto.

Arrebento-me ondas na areia branca.


terça-feira, 18 de agosto de 2015

Rosário


Não sabia ainda o que aqueles desenhos
que agora fazia queriam dizer:
talvez as fotos, instantâneos de um mundo
corrido e louco já não tivessem tanta força
e a poesia, esta atávica e imemorial já
estivesse perdendo o viço e o propósito.

Angustiado, contorcia as mãos em bola,
roía mal as unhas, fazia delas alfinetes,
coçava e arranhava nervoso canelas,
antebraços e as costas nuas depois
da corrida diária na pracinha do bairro.
Brotavam micropontos de sangue na pele feito
contas de um rosário de expressões a desfiar
ou como as flores das sempre-vivas
que aparecem em cachos redondos
nas serras por aí.

Não sabia ainda o porquê
de tanta expressão,
de tanta música nas madrugadas,
de tanta insônia,
de tanto bruxismo.
Não sabia que sabia
escrever coisas com as luzes
todas apagadas.

Talvez quisesse alcançar de novo
um coração desconhecido,
talvez alcançar de novo o desconhecido
que ainda habitava em seu coração.

Queria eliminar de vez esse
talvez e também as reticências
em sua vida.












sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Silva - "Cansei"


Essa música merece um post no blog pois tem o espírito dos sentimentos que aparecem por aqui de vez em quando.

*Lúcio Silva de Souza, mais conhecido pelo nome artístico SILVA, é capixaba de Vitória.
Cantor, compositor, produtor musical e multi-instrumentista, ficou conhecido após o lançamento do seu primeiro álbum Claridão em 2012 pela Slap. Em 2014 lançou seu segundo álbum Vista pro Mar pela Som Livre.
É um dos talentos em franca ascensão na MPB.



CANSEI

Cansei de ser eu mesmo
Me deixa ser você
A vida não perdoa
Quem quer se reescrever

Cansei dessa rotina
Já não ouço o mesmo som
Cansei desse negócio
De tentar ser bom

Cansei dos meus retratos
Da falsa sensação
De ter você por perto
Não seu coração

Não me olhe desse jeito
Retoque seu batom
A sua vaidade
Faz parecer tão bom
Faz parecer tão bom
Faz parecer tão bom

Cansei dos mesmos rostos
Dessa repetição
Me deixa ser o centro
Da sua distração

Cansei dos inquilinos
Da minha solidão
Olhar você dormir
Não é compensação

Cansei da velha ideia
De segurar você
A reta do inseguro
Acaba na TV

Me entregue este controle
Me entregue a alma então
Amor você parece
Disco arranhado em vão
Pura repetição
Disco arranhado em vão
Pura repetição
Pura repetição

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

C'est la vie


O menor sinal de vida que ela dava
detonava nele um processo monstro irreversível:
sua alma inteira luz saía por cada poro do corpo,
expulsando de lá as traças que roíam buraquinhos
em várias páginas vividas e já prontas
de um livro marrom escrito a quatro patas
com o velho medo de abrir a boca
e a solidão que isso gerava.

Compunha músicas agora,
escrevia poemas,
tratados sobre navegação,
erguia templos de mil anos,
era barroco e modernista,
traçava rotas da seda,
reconhecia todas as constelações do céu,
percorria o Caminho de Santiago todo santo dia,
dizia-se amadurecido e até criticava os telejornais.

Enrolava-se porém nas contas feitas no Q.V.L.,
nas equações de segundo grau,
no refrão da música favorita cantado aos gritos
na acústica mentirosa de um banho quente,
na quantidade exata de pó para o café das visitas,
no momento certo de sinalizar para o taxi
ou de atravessar a rua sobre a faixa de pedestres.

Gaguejava sempre
ao planejar dar a ela um simples "oi"
ou ao tentar descobrir o timing preciso para o adeus,
pois sabia que a ruptura é sempre um momento de dor,
necessário, porém triste.

Enfim...



segunda-feira, 10 de agosto de 2015

(re)Verso e Prosa


Ela sentia-se sozinha
em meio a todas as coisas que construíra
na densidade da profissão fonte de decisões inapeláveis
na energia da humanidade que a cercava com caras e bocas
mas que fluía limpa e pura de dentro do seu coração gigante.

Ele sentia-se sozinho
no vácuo momentâneo de um trabalho duvidoso
no éter de pensamentos longos e estradas ainda a percorrer
na energia da humanidade que dele emanava plena
e da qual sempre procurara se esquivar.

Sentiam-se sozinhos em suas escolhas.

Eram iguais nas diferenças e angústias compartilhadas.
Falavam abertamente sobre assuntos fechados e coisas
comuns aos seus respectivos corações.
Olhavam-se de perto com respeito quase cego e depois
viravam-se para o lado para dormir o sono digno dos justos.

Em camas separadas.


sexta-feira, 7 de agosto de 2015

Lila (Carlos Lascano)


Esse filme é lindo e talvez reflita o espírito que gostaria de alcançar com o meu "Ponto de Fuga".






sábado, 1 de agosto de 2015

Ipês


Roxos
Amarelos
Rosas
Brancos

Os Ipês são como os
Amores de verdade:
Nunca tornam-se árvores comuns
Quando despem-se de suas flores
Pois sabemos exatamente
O que esperar deles
Na próxima estação.