"Sempre que desejo contar alguma coisa, não faço nada;
mas quando não desejo contar nada, faço poesia."
Manoel de Barros - Livro Sobre Nada

"O momento em que, hipoteticamente, você sente que está andando nu pela rua, expondo demais o coração, a alma e tudo o que existe lá dentro, mostrando demais de si mesmo. Esse é o momento em que, talvez, você esteja começando a acertar. "
Neil Gaiman - O Discurso "Faça Boa Arte"

"...eso es lo que siento yo en este instante fecundo..."
Violeta Parra - Volver a Los Diecisiete

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

Sou do Mundo, Sou Minas Gerais: o dia em que conheci John Lennon e os Beatles.

  

    Lembro-me da morte de John Lennon como se ela tivesse acontecido ontem.

   No começo de dezembro de 1980 eu estava na casa da tia Lanza em Rio Acima, lugar para onde normalmente ia quando as férias escolares chegavam, além do sítio da vovó Lola na Pampulha.

    Acordar de manhã, vestir uniforme, calçar chuteiras (e no meu caso, também as luvas de goleiro), jogar bola com os primos e amigos até ela deixar de existir pela escuridão da noite eram minhas maiores preocupações aos 9 anos de idade. Fora isso, ainda pipocavam na memória o drama e as imagens da final do Campeonato Nacional daquele ano, que o Atlético, com um timaço, perdera meses antes no Rio de Janeiro. Foi a minha primeira e, ainda hoje, minha maior decepção no futebol. 

    No campinho da tia Lanza eu me vingava dos cruzeirenses e cariocas de ocasião aos gritos de "...defeeeeendeeeeeuuuu, João Leiteeeeeee..." a cada chute dos Zicos, Nunes e Andrades que compartilhavam aquele gramado comigo. 

    O chamado para o almoço era a única coisa que conduzia a meninada, a contragosto, para dentro de casa. Uma espécie de intervalo do primeiro para o segundo tempo do dia que demorava uma eternidade para passar, afinal de contas, o terror de que morreríamos de congestão implantado em nossas mentes pelos mais velhos nos impedia de correr atrás da bola nas duas horas seguintes, pelo menos.

    Naquele dia 9, enquanto esperava o staff da minha tia terminar de colocar a mesa, eu assistia ao Globo Esporte na pequena TV colorida que havia no quarto dela. Mais para o final do programa, o apresentador Léo Batista anunciava uma homenagem ao famoso astro inglês, assassinado na noite anterior por um fã na entrada de seu prédio em Nova York. Foram mostradas imagens dos torcedores do Liverpool e do Everton, os times da cidade do Beatle, consternados com a notícia. 

    Eu assistia àquilo meio aéreo, pensando no futebol da tarde, tentando entender do que e de quem estavam falando, quando um de meus primos (acho que foi o Bruno) que assistia à tv da sala, irrrompeu pelo corredor e entrou no quarto com os olhos arregalados. Esbaforido, me perguntou se eu vira que o John Lennon tinha sido assassinado. 

    Olhei para o Léo Batista na TV, olhei para o Bruno e respondi:

     - Vi sim!!!

    Em seguida ele me perguntou: 

    - Você sabe quem era ele?

    Então emendei de primeira, isolando a bola na arquibancada (ou engolindo um frango memorável, já que estávamos na hora do almoço):

    - Sei sim, mas em qual time que ele jogava mesmo???? 

    Foi assim que, há quarenta anos, conheci Lennon, McCartney e os Beatles...


(acervo pessoal)