Ela é uma mendiga, como as centenas que existem nas ruas de Belo Horizonte.
Figura das mais repugnantes que já vi na vida: magérrima, cabelos loiros encaracolados e colados de suor ao crânio, dentes disformes e escassos, short sempre abaixo da linha do quadril, blusa de malha um número a menos do que seria normal, sem sapatos, muito suja, muita cola de sapateiro.
Raramente é vista fora do circuito Bahia, Augusto de Lima, Álvares Cabral, Espírito Santo e Guajajaras, onde, certa vez, quase me agrediu quando recusei-lhe uns trocados:
"-AAAAAHHH FELADAPUTA! É POR ISSO QUE JÁ MATEI CINCOOOO..." ecoou sua voz rouca pelo cânion de prédios às dez da manhã.
A maior parte do tempo vive de cócoras, semi rasteja na calçada em frente à Igreja de Lourdes, à mercê da caridade e da indiferença de quem passa (alerta de mea culpa acionado).
E foi ali que tudo aconteceu:
Subia a pé, automático, pelo lado par da rua da Bahia, sol a pino, trânsito pesado, cabeça focada em algum compromisso genérico quando na altura do Colégio Imaculada a vi na posição de sempre, em frente à Igreja.
Imediatamente me transferi para o outro lado da rua para não ter que passar perto daquela figura.
Segui em frente e à medida em que chegava perto da Igreja vi uma senhora bastante idosa tentando, em vão, atravessar a rua que jorrava uma Itaipu inteira de carros, motos, ônibus e caminhões.
A mendiga estava agachada ao lado da senhora, debaixo de uma árvore magra e voltada para a igreja. De repente, do nada ela se levantou, cochichou algo no ouvido da idosa, a tomou pelo braço e, com gestos encantados, fez parar o trânsito e o mundo.
Atravessaram juntas para o outro lado da rua.
Voltou para sua árvore antes que os carros ousassem sair do lugar e não houve uma buzinada sequer.
Foi há quatro ou cinco anos atrás.
Lembro disso todo santo dia.
(acervo pessoal) |
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